Criança de pés no chão
não permito que nada me distraia
registro na mente e no coração
o caminho em direção à praia
Era minha primeira vez
a ansiedade me consumia
a descida da serra me fez
sentir o cheiro da maresia
Era um cheiro com sabor
me aguçava o paladar
tinha forma, contorno e cor
me dava vontade de "comer" o mar
Lá estava eu, diante da imensidão
admirando a bela pintura
obra-prima da Criação
um quadro sem moldura
A areia escorria entre os dedos
e de repente comecei escutar
o mar sussurrando seus segredos
que eu jurei jamais revelar
"Minhas águas salgadas
multiplicam a vida
agora são profanadas
agora são invadidas
Minhas águas, espelho do sol
replica seu brilho fantástico
ofuscado por petróleo e etanol
e uma espessa camada de plástico
Até a brisa tem cheiro diferente
as ondas não quebram como antes
minhas águas maculadas com poluentes
por uma sociedade arrogante
Águas claras impelidas pelo vento
quintal da gaivota e do albatroz
agora já faz um bom tempo
que não ouço sequer sua voz
Aos meus pés o chá de areia
esconderijo das belas conchinhas
os grãos agora serpenteiam
entre embalagens e latinhas
Para onde foram meus cardumes?
será que um dia voltarão?
o homem erra e não assume
ainda acha que tem razão
Peço desculpas pelo desabafo
sei que agora me olhas diferente
se não inspiro mais teus passos,
peço desculpas novamente
Você é apenas uma criança!
pelo desabafo, me retrato, com certeza
mas não podes crescer sem a esperança
de desfrutar dos encantos da natureza"
O mar desabafa aos quatro cantos
"hoje sou inóspito e enfadonho"
despertei em soluços e pranto
agradecida por ter sido um sonho
Ao sonho, no entanto, proponho
contar toda a verdade
nunca tive na vida um sonho
tão próximo da realidade!