Eu tenho raiva, ojeriza do amor.
A cabeça do amante é uma arapuca onde o pensar é o outro que ocupa.
Como um pássaro mesmo que estivesse prestes a voar,
perderá o único juízo que tinha.
Mas já não perderá, pois não se perde o que já não possuía.
Eu tenho raiva do amor, ojeriza.
O amor meloso dos apaixonados apenas me causa enjoo
e um nojo adoidado na vida.
Depender do outro para existir é a pior escravidão.
Existir para o outro nem pensar então.
A tua saliva contaminando de fel a boca e a vida de outro ser.
Mas no começo é puro mel.
Quero a razão mais límpida
em que não me entre o peso da névoa da paixão.
A existência saudável de um casal depende mais da razão que de paixão.
Não quero que no estio a chuva dos olhos venha inundar a paisagem que eu queira observar,
e que não precise da existência de outra vida
para significar alguma coisa para minha escrita.
E que ela, minha escrita, não venha precisar
falar do amor para ganha alguma vida.
Afinal, esqueçamos tudo então
e partamos para outra lida
mais fácil de exprimir, em que nos fale mais forte a razão.
(do volume "Qualquer Possível Infinito e outros poemas")