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Mar de óleo

Mar de óleo
Instituto Verdeluz
ago. 1 - 7 min de leitura
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Nos primeiros dias de setembro de 2019, o Gtar Verdeluz, projeto que faz o monitoramento, resgate e necropsia de tartarugas marinhas em Fortaleza, recebeu vários chamados para o resgate de uma tartaruga na costa leste da cidade, na comunidade da Sabiaguaba. 

O Gtar é um dos quatro projetos que compõem o Instituto Verdeluz, uma organização não-governamental (ONG) que promove a reconexão com a natureza por meio do engajamento jovem e da educação ambiental. A instituição é formada por voluntários e se sustenta através de doações de pessoas que valorizam  seu trabalho. 

Ao receber chamados de encalhes de tartarugas, a correria é grande para salvá-las. Os jovens voluntários, em geral estudantes de biologia e oceanografia, se mobilizam  para chegar ao local e prover o bem-estar do animal.

Certa vez, o grupo notou algo de diferente em uma das tartarugas encalhadas. Ela estava coberta por uma substância escura, pegajosa e com um forte odor semelhante a piche. Alguns dias depois, Gtar foi contactado novamente por mais encalhes de tartarugas marinhas: todas apresentando as mesmas características. Moradores de uma comunidade no bairro Serviluz, em Fortaleza, também alertaram ao Gtar que encontraram mais tartarugas nessas condições.  O mesmo foi observado em Flecheiras, Taíba e Jericoacoara: outras praias cearenses.  

Somado a isso, o Instituto Verdeluz recebeu relatos de derrames de petróleo em algumas praias do Piauí, Rio Grande do Norte e Pernambuco. Apenas em setembro de 2019, o Gtar contabilizou cinco encalhes de tartarugas encontradas com esse composto no estado do Ceará. Jornais já cobriam o assunto, mas ninguém sabia ao certo como essa resina apareceu no ambiente marinho. 

Ver os animais naquele estado deixou os voluntários da ONG aflitos e com sentimento de impotência em relação às enormes manchas de piche no litoral. Era preciso fazer algo. Assim, membros do setor de Ativismo e do Gtar passaram a compartilhar nas redes sociais as condições em que se encontrava a orla de Fortaleza. Foram enfatizadas também a ampliação do Aterro da Praia de Iracema e as obras na região do Hotel Gran Marquise: atividades com grande impacto ambiental.

Investigar a origem da substância encontrada nas tartarugas se tornou necessário e urgente, especialmente porque muitas espécies daquele ecossistema estão ameaçadas de extinção, tais como o boto cinza, peixe boi e as cinco espécies de tartaruga marinha que ocorrem no Brasil.

O Verdeluz expôs sua indignação acerca do ocorrido ao fazer uma denúncia formal sobre o caso. O mesmo foi pautado em espaços políticos, demandando às autoridades o respeito e aplicação da Legislação Ambiental. Foram registradas fotos, vídeos e coletados depoimentos dos moradores da comunidade. A denúncia foi divulgada nas redes sociais, através desta publicação: (https://www.instagram.com/p/B2z7HzPFp_q/?utm_medium=copy_link)

Esse post teve grande engajamento, com mais de 1900 curtidas e mais de mil compartilhamentos, incluindo o da atriz Bruna Marquezine, que marcou o perfil do Instituto Verdeluz. O tema foi abordado pela mídia local, nacional e internacional, em programas de TV, rádio, na internet e em podcasts. 

Tartaruga com óleo - Instituto Verdeluz 2019 - repost da atriz Bruna Marquezine

 

Ao final, o vazamento de óleo no litoral nordestino foi considerado o crime ambiental de maior extensão ocorrido no Brasil. Em 18 de outubro de 2019, o Instituto Verdeluz registrou 37 encalhes de tartarugas no Ceará desde o início de setembro, onde 7 delas apresentaram algum contato com óleo. Até 9 de novembro de 2019, a ONG contabilizou pelo menos 17 tartarugas que foram encontradas com óleo nas praias. Infelizmente, apenas uma foi resgatada com vida. Após três meses do crime ambiental, vestígios de petróleo ainda são encontrados em 37 pontos ao longo do litoral cearense.

Segundo o mais recente balanço do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), atualizado no dia 19 de março de 2020, um total de 1009 locais já foram afetados pelo óleo, em 130 municípios. O óleo atingiu 11 estados, sendo nove no Nordeste e dois no Sudeste do país. Ainda em 24 de julho de 2020, quase um ano após o início dos casos, voluntárias atenderam a dois encalhes de tartarugas verdes adultas na Praia do Futuro. Elas foram encontradas com fragmentos de fita cassete. Nos intestinos de uma fêmea e macho adultos foi encontrada uma substância enegrecida pegajosa semelhante a óleo: provavelmente resquícios do desastre de outrora. Devemos destacar que as tartarugas adultas são essenciais para a reprodução e perpetuação da espécie. 

As consequências que o óleo pode causar nos animais são preocupantes. Na temporada de desova das tartarugas, aquelas que tiveram contato com o poluente foram impedidas de chegar ao mar. As que apresentaram petróleo em seu interior tiveram seu bem-estar, saúde e vida afetados de forma irreversível.

O Verdeluz atuou em grupos de trabalho e reuniões permanentes sobre a problemática do petróleo, juntamente com a Secretaria do Meio Ambiente do Estado do Ceará (SEMA). O monitoramento observou durante seis meses animais marinhos em nove localidades do litoral cearense, que foram afetadas pelo óleo.

Após deixar um rastro tóxico por milhares de quilômetros, o petróleo foi sendo aos poucos retirado. Voluntários ajudaram a limpar as praias e as manchas não ficaram mais visíveis a olho nu. Porém, essa substância continua impactando todo o ecossistema marinho, assim como o ciclo de vida das tartarugas. Estes impactos durarão por décadas!

A perda desses animais entristece profundamente a todos que compõem  o Instituto Verdeluz. Ela não os deixa esquecer do crime realizado, cujos impactos são imensuráveis. A ONG vem ressaltando a urgência de políticas públicas voltadas à conservação de tais animais ameaçados de extinção, através do Centro de Quarentena para a estabilização e primeiros socorros dos animais encalhados vivos. Ela contará também com a base de Educação Ambiental, ainda a ser implementada, que promoverá a conscientização da população fortalezense quanto à proteção desses organismos.

A base para os animais marinhos mais perto de Fortaleza fica em Areia Branca, através do Projeto Cetáceos da Costa Branca, no Rio Grande do Norte. Todos os encalhes de tartarugas vivas são encaminhados para Natal pelos membros do Instituto Verdeluz, que tem salvado a vida desses animais de forma totalmente voluntária. 

Que esses encalhes permaneçam vivos em nossa memória, assim como os crimes que seguem sem solução no Brasil.

 


Veja o estado das tartarugas marinhas encontras com óleo:

 

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