Certa vez me disseram que o bem e o mal caminhavam lado a lado, quase de mãos dadas, hoje sei que a vida é exatamente assim! A intensidade descabida e frenética me faz vivenciar tudo à flor da pele, não posso dizer que nos últimos meses fui feliz, mas a infelicidade também não me abraçou. Se isso é equilíbrio, dor disfarçada ou paz de domingo ainda não sei.
Um eu isolado, por horas perdido e preocupado fez abrigo no próprio peito e declarou que todo leito seria digno de sua emoção. Um eu comovido e estagnado revelou-se durante a pandemia. A cada caso relatado, um misto de emoções eram sentidos, uma revolta interna baseada em questionamentos que possivelmente nunca terão resposta.
O mundo que antes caminhava sobre uma corda bamba, precisou cair e quem sabe assim despertar aqueles que não o enxergavam como a primeira casa, fui junto e de cara no chão me machuquei. Mas quem é que não está ferido? Uma perda familiar, um desemprego, a falta de um abraço, de um amigo.
A sociedade contemporânea desabou aos poucos, e nós já pobres e desolados, clamamos por socorro as mais variadas fontes de fé e expectação. Para superar a dor, tivemos de inovar, usar a criatividade e buscar o que antes era inalcançável. Não somos os mesmos, mas não queremos ser. A inconstância ficou cada vez mais evidente, da alegria a tristeza, do choro ao riso, do amor ao luto... Me perdi inúmeras vezes, mas nunca me encontrei tanto.
Fiz morada em casulos artísticos, em que pintei e compus. Meus versos nunca foram tão carregados de sentimentalismo, apesar de que deixei o meu eu romântico pelo caminho e notei o realismo, falei e falo de gente de verdade, carente e quase calejada de viver. Abri as cortinas mais cedo, vi programas musicais até tarde, cantei ainda mais alto no chuveiro, abracei ainda mais forte os meus pais, inovei na cozinha e cuidei de mim. Permiti-me descansar nas tardes chuvosas e deixar para trás aquilo que me machucava. Estou em quarentena, como deve ser, mas se quer saber mesmo a verdade... Não há na terra isolamento que possa enclausurar aqueles que vigoram com a alma livre!
Raul Miqueletto/ @viletto.escritor