João Pedro Matos Pinto, adolescente negro, 14 anos, estudante, morreu assassinado durante uma ação policial, em maio de 2020. Estava na casa de um familiar, jogando sinuca, quando policiais, civis e federais, entraram atirando. João Pedro foi morto com um tiro, dos mais de 70 que foram disparados, em mais uma operação policial para combater o denominado crime organizado. João foi o 240 baleado neste ano, no Rio de Janeiro; destes, 12 em situações envolvendo agentes do Estado, com cinco mortes (COELHO, 2020; G1, 20201). “A cada 23 minutos, um jovem negro morre no Brasil”, informou a campanha da Organização das Nações Unidas (ONU Brasil), em 2017 (MARQUES, 2017).
No mesmo mês, George Floyd, homem negro, 46 anos, segurança, foi assassinado nos Estados Unidos (EUA) por um policial branco. O policial se ajoelhou sobre o pescoço de George Floyd, que estava deitado no chão, imobilizado. Mesmo com as reclamações dele – “não consigo respirar” – o policial permaneceu ajoelhado (LABORDE, 20201,2). Floyd, preso por suspeita de fraude, morreu pela ação de um policial branco com histórico de envolvimento em episódios violentos. A maior parte das queixas, arquivada. Recebeu, sim, dois reconhecimentos pelos trabalhos prestados (BBC BRASIL, 2020).
O que estas mortes e estes cenários escancaram, mais uma vez? Que “A Carne mais Barata do Mercado é a Carne Negra. Na Cara Dura, só Cego que Não Vê”***. O racismo mata e vem matando há muito tempo a população negra, em diferentes partes do mundo. O genocídio é histórico, sobretudo em países cuja escravidão os constituíram. Sociedades escravocratas partilham de alguns valores e práticas semelhantes oriundos de um sistema bastante violento que tinha como pressuposição a propriedade de uma pessoa por outra (GONZALEZ, 1988; SCHWARCZ, 2019). Brasil e Estados Unidos são países grandes, que possuem realidades sociais, culturais, econômicas e históricas diversas, e distintas. Um viveu por muito tempo (ou vive?!) sob a crença falaciosa da democracia racial, o outro vivenciou o apartheid.
Não é nossa pretensão aqui debater estes aspectos e muito menos analisá-los com a profundidade que requerem. Ao conectar os dois assassinatos, queremos apresentar algumas reflexões sobre o racismo estrutural, um denominador comum aos dois países, algumas de suas expressões no contexto atual pandêmico e como nós que somos reconhecidas/os socialmente como brancas/os podemos participar/contribuir com a luta antirracista. Acatando a provocação de Angela Davis em sua célebre fala: “Numa sociedade racista, não basta não ser racista, é necessário ser antirracista”. Reflexões estas em processo de amadurecimento, paridas no calor das indignações diante dessa realidade atual tão brutal e perversa.
Assim, se transformam também em um convite para que venham dialogar e refletir conosco. “Tá ligado que não é fácil, né, mano/a/e? Se liga aí”***. São muitos os motivos que impõem à militância negra uma luta histórica constante contra uma realidade inaceitável, denunciando também as respostas insuficientes do Estado brasileiro, o que exige uma vigilância e um esforço permanentes de compreensão e de luta, nos diz Sueli Carneiro (2007).
Para ler o texto na íntegra:
*Texto publicado originalmente na seção Debates e Pensamentos do Observatório de Análise Política em Saúde:
http://www.analisepoliticaemsaude.org/oaps/pensamentos/21adabac25a3dfed2ef961d139aeba83/3/